E ai, pessoal. Tudo bem? Isolados em casa e se cuidando? Na semana passada falamos sobre as opções de anticoncepcionais masculinos (LINK). Hoje vamos complementar o tópico sobre contracepção falando dos anticoncepcionais femininos.
Os anticoncepcionais femininos provavelmente são os mais conhecidos e praticamente toda mulher já teve contato com algum método contraceptivo. Atualmente, a prevalência do uso de contraceptivos por mulheres entre 15-49 anos no Brasil é de aproximadamente 80%. A prevalência pode variar dependendo do país e região (“Products - Data Briefs - Number 327 - December 2018” 2019, “Contraceptive Prevalence, Any Methods (% of Women Ages 15-49) | Data” n.d.). Por exemplo, nos Estados Unidos a prevalência foi de aproximadamente 64.9% no período de 2015-2017 (“Products - Data Briefs - Number 327 - December 2018” 2019).
A escolha do método contraceptivo deve ser feita com orientação médica. Isso porque cada um deles tem vantagens e desvantagens, as quais devem ser compatíveis com a paciente para alcançar o melhor efeito com menores riscos possíveis. Então vamos começar classificando os métodos contraceptivos usados por mulheres sexualmente ativas.
Métodos comportamentais
O fundamento desses métodos é basicamente observar alterações do organismo feminino durante o ciclo menstrual. Um exemplo disso é o planejamento de uma gravidez através do acompanhamento do período fértil da mulher durante o ciclo.
Nesse tipo de métodos temos alguns bem conhecidos:
1) Método de Ogino-Knaus
É a famosa Tabelinha. Esse método baseia-se no fato que a ovulação (liberação do óvulo) ocorre próxima do 14 dia do ciclo, permitindo estimar em qual período a mulher está fértil. Assim, para evitar a gravidez o casal não deve ter relações sexuais com contato genital durante o período fértil. Mas como a gente calcula esse período fértil?
Primeiro a gente calcula a duração do ciclo menstrual, contando o primeiro dia (dia da menstruação) e o último dia (véspera da próxima menstruação) do ciclo. Vai acompanhando esses dias por alguns meses para ter uma noção mais precisa do padrão menstrual. É importante anotar os dias do ciclo e saber o padrão certinho porque diversos fatores podem alterar o ciclo, incluindo estresse e alimentação. Anotando diversas vezes a mulher pode ter uma ideia mais precisa do seu ciclo.
O primeiro passo para calcular o período fértil é anotar a duração do ciclo mais longo e do ciclo mais curto. Para determinar o início do período fértil basta subtrair 18 (dezoito) dias do ciclo mais curto. Por exemplo, se o ciclo mais curto durou 24 dias, o período fértil começa em: 24 - 18 = 60 (sexto) dia do ciclo.
Por outro lado, para calcular o fim do período fértil basta subtrair 11 (onze) dias do ciclo mais longo. Por exemplo, se o ciclo mais longo durou 35 dias, o período fértil terminal no dia: 35 - 11 = 24 dia do ciclo.
Este método é consideravelmente simples, mas precisa de atenção na hora de anotar os dias e qualquer alteração no padrão menstrual. Além disso, ele permite que a mulher entenda melhor sua fisiologia, é barato e também não apresenta efeitos colaterais. Atualmente existem alguns aplicativos que podem ser facilmente encontrados na Google Store e a Apple Store nos celulares e que facilitam entender esse padrão.
Uma desvantagem importante da Tabelinha é a alta taxa de falha quando comparado com métodos modernos, como anticoncepcionais orais (vamos falar deles lá na frente!). A Tabelinha é menos precisa porque a duração das fases do ciclo menstrual varia de mulher para mulher e pode ser afetada por outros fatores, como estresse, uso de medicamentos e doenças. Assim, a Tabelinha pode acabar enganando até as mulheres com ciclo regular.
2) Método da temperatura basal
Esse método consiste em determinar período fértil com base na temperatura corporal em repouso. O princípio desse método é que após a ovulação a temperatura corporal aumenta alguns décimos de grau devido a liberação de progesterona. Esse aumento de temperatura indica que a mulher está entrando no período fértil e se mantém até a próxima menstruação. É importante falar que muitos fatores afetam esse método, incluindo ingestão de bebida alcoólica, estresse, mudanças de ambiente, problemas no sono e problemas de saúde.
No primeiro dia do ciclo, a mulher deve medir a temperatura antes de qualquer atividade. De manhã e depois uma boa noite de sono de pelo menos 5 horas é o mais recomendado para ter uma medida mais confiável. Todo dia a mulher pode registrar a temperatura para acompanhar a evolução durante o ciclo. É importante que o termômetro seja o mesmo todos os dias e que qualquer mudança no termômetro seja anotada. Por exemplo, se o termômetro quebrou, anotar em qual dia isso aconteceu e quando começar usar um novo. Esse cuidado com o termômetro é fundamental, pois é possível que diferentes termômetros forneçam medidas diferentes da temperatura, o que pode alterar o registro do ciclo.
Para facilitar na análise do ciclo existem alguns aplicativos e produtos que podem ajudar. Geralmente esses aplicativos mostram um gráfico da temperatura. Para determinar o fim do período fértil basta encontrar um período de 4 dias de aumento persistente da temperatura e perceber se há uma diferença de no mínimo 0,2°C entre a última temperatura baixa e três temperaturas altas. O período fértil acaba no 4° dia depois da última temperatura elevada.
3) Método do muco cervical ou Billings
Esse método consiste em observar diferenças no muco cervical e a sensação causada por ele na vulva. O muco cervical é um líquido produzido no colo do útero e que apresenta algumas mudanças durante o ciclo menstrual. No início do ciclo, o muco cervical é mais pegajoso e espesso, o que dificulta a movimentação dos espermatozoides. A situação muda no período fértil, quando o muco cervical fica mais fluído, lubrificante e transparente (parecido com clara de ovo), facilitando a movimentação dos espermatozóides até o colo uterino.
Esses são alguns métodos comportamentais bem conhecidos e que podem ser facilmente usados sem gastar muito e com relativa segurança se realizados corretamente e com acompanhamento médico. Talvez a principal desvantagem desses métodos é que a eficácia deles pode variar bastante de acordo o estilo de vida e alterações no ciclo.
Anticoncepcionais hormonais
Esses métodos consistem em usar hormônios parecidos com os hormônios produzidos nos ovários da mulher, estrogênio e progesterona. O estrogênio e a progesterona são os principais hormônios envolvidos nas alterações no organismo durante o ciclo menstrual. Administrando doses adequadas desses hormônios é possível bloquear a ovulação e reduzir as chances de gravidez.
Figura 3: Estrutura molecular dos hormônios estrogênio e progesterona.
A pílula anticoncepcional pode ser uma combinação de estrogênio + progesterona ou somente de progesterona. É importante ressaltar que a pílula anticoncepcional NÃO protege contra Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST).
A pílula combinada de estrogênio (geralmente estradiol) + progesterona reduz os níveis de hormônios importantes para ovulação, como hormônio luteinizante (LH) e o hormônio folículo estimulante (FSH) e esteroides; impedindo que a ovulação ocorra. Tanto o estrogênio quanto a progesterona podem fazer isso sozinhos, mas combinando os dois existe uma ação bem mais acentuada para bloquear a ovulação.
As pílulas combinadas podem ser classificadas em monofásicas (apresentam uma concentração fixa de estrogênio e progesterona em todas as pílulas) ou multifásica (apresentam concentrações variáveis de hormônios em cada pílula). Esses medicamentos geralmente são encontrados em embalagens com hormônios para 21 dias com mais 7 pílulas sem nenhum hormônio. O sangramento menstrual é previsível e ocorre durante os dias de uso das 7 pílulas sem hormônio ativo.
A pílula de progesterona ou minipílula contém somente este hormônio ou algum derivado e também são altamente eficazes na contracepção. A progesterona tem um efeito mais local no útero, atuando principalmente no aumento da espessura do muco cervical (lembra do método do muco cervical que falamos acima?) e deixam o endométrio mais fino. O endométrio é o tecido que reveste a parede do útero e que prepara útero para gestação. Com o muco cervical mais espesso, a motilidade dos espermatozóides fica reduzida, o que dificulta que ele encontre um óvulo e a fertilização aconteça. Além disso, como o endométrio fica mais fino, fica mais difícil para um óvulo fertilizado se aderir à parede, reduzindo as chances de gravidez.
A pílula deve ser tomada todo dia e de preferência no mesmo horário. Além disso, geralmente não são necessárias pausas. Caso a mulher pare de tomar o anticoncepcional, a capacidade de engravidar volta em pouco tempo.
Os hormônios estrogênio e progesterona também podem ser administrados com uma injeção. Essa injeção funciona muito bem e pode ser administrada todo mês ou de 3 em 3 meses.
Anel vaginal
Muita gente não conhece o anel vaginal, mas é um dos métodos contraceptivos de maior eficácia, sendo este combinado com os hormônios estrogênios e progesterona. Ele libera esses hormônios de forma regular na parede vaginal, os quais caem na corrente sanguínea para prevenir a gravidez.
Este é um método para mulheres que não desejam ou não toleram contraceptivos orais ou até mesmo os injetáveis. Além disso, o anel vaginal atua inibindo a ovulação e consequentemente, impede que os óvulos sejam liberados dos ovários. Este anel é colocado na vagina da mulher uma vez por mês.
Desvantagens: Não protege contras as Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST).
E por fim a famosa pílula do dia seguinte
A pílula do dia seguinte é somente usada para casos de contracepção de URGÊNCIA! Este é o único método utilizado após a relação sexual para prevenir gravidez indesejada. Esta pílula deve ser tomada nas primeiras 48 horas após a relação sexual e apenas quando o método contraceptivo habitual falha ou foi esquecido. Quanto mais cedo a pílula for tomada, melhor.
É importante ressaltar que este medicamento NÃO é um método contraceptivo tão eficaz como os outros que falamos e só deve ser utilizado excepcionalmente. Não recomenda-se recorrer com frequência este método de urgência, pois pode gerar efeitos hormonais negativos. Busca-se a pílula do dia seguinte apenas em casos de extrema urgência!!!
Anticoncepcionais de barreira:
Nessa classe de anticoncepcionais temos métodos que colocam obstáculos no caminho dos espermatozóides e os impedem fertilizar o óvulo. Nesse grupo temos a camisinha feminina, o diafragma e o dispositivo intra-uterino (DIU).
1) Camisinha feminina
A camisinha feminina é um tubo de plástico, fino e resistente que já vem lubrificado e devem ser colocada antes do contato genital. A camisinha feminina é protege contra gravidez e também de IST/HIV/AIDS. Mas lembre-se que ela só protege se for usada antes de TODA relação sexual! A camisinha funciona segurando o esperma na relação sexual e impede que os espermatozóides entrem no corpo da mulher.
2) Diafragma
O diafragma é uma capa de borracha ou silicone que é colocada na vagina e cobre a entrada do útero. O diafragma pode ser encontrado em diferentes tamanhos e a mulher pode buscar ajuda para escolher o mais adequado. Além disso, podem ser usados junto com espermicidas, que mata os espermatozóides. Uma vantagem do diafragma é que você pode reutilizá-lo! Depois do ato sexual, basta lavar com água e sabão neutro, secar bem com um pano macio e guardar em lugar seco e fresco, não exposto à luz do sol. Uma desvantagem é que o diafragma NÃO protege contra IST/HIV/AIDS.
3) DIU (dispositivo intra-uterino)
O dispositivo intra-uterino (DIU) e o sistema intra-uterino (SIU) são dispositivos ou sistemas com função bem parecida que são inseridos no útero para evitar a gravidez. Existem diferentes formatos de DIU/SIU, dependendo da estrutura da cavidade uterina da mulher. Por exemplo, existem dispositivos em formato de T, Y, de ferradura e ômega.
A diferença entre o DIU e o SIU é sua composição: enquanto o DIU é recoberto de cobre e não possui nenhum hormônio, o SIU é de plástico e libera hormônios (geralmente similares à progesterona) diretamente no útero. O resultado contraceptivo de ambos é similar e se baseia em inibir os espermatozóides, impedindo que eles se encontrem com o óvulo.
O DIU/SIU deve ser colocado por um profissional de saúde treinado. Apesar dessa necessidade de ajuda profissional, estes dispositivos não atrapalham a mulher e nem machucam o parceiro ou parceira durante o sexo. A mulher que usa DIU/SIU pode apresentar aumento do sangramento menstrual e aumento na duração da menstruação e cólicas. Tais efeitos não trazem problemas para a saúde, a menos que a mulher tenha anemia severa. O DIU também NÃO protege contra IST/HIV/AIDS e NÃO é recomendado para mulheres que se relacionem com mais de um parceiro/parceira sexual que não se protegem durante sexo, por exemplo usando com camisinhas.
Outros métodos
Conclusão
Hoje fizemos um resumão de métodos anticoncepcionais femininos. Nossa intenção foi de introduzir o tema e mostrar quais os métodos mais usados e como funcionam. Para mais informações, você consultar nossas referências! E lembrem-se: USEM CAMISINHA, pois é o único método para prevenir a IST!
Curiosidades
Vocês sabiam que muitos métodos contraceptivos tem eficácia acima de 99%, mas quando não combinado com a camisinha, pode acontecer da mulher ficar grávida? Pois é, ainda não existe nenhum método perfeito, mas a maioria dos métodos existentes chegam perto quando usados corretamente. Por mais que as porcentagens sejam mínimas, pode acontecer da mulher engravidar por diversos motivos.
Convido a vocês a pesquisarem no google sobre as histórias de mulheres que tomavam os métodos contraceptivos, menstruam normalmente e de repente descobriram que estavam grávidas quando já estavam parindo. E até mesmo de histórias de mulheres que usam DIU e o neném nasceu segurando o DIU na mão e outro com o DIU no cabelo.
Figura 12. Bebês inesperado de mães que usavam DIU.
Autor
Marcos V. Santana
Farmacêutico
Mestre e Doutor em ciências e Biotecnologia
Referências
Um guia ilustrado sobre como usar cada método contraceptivo citado: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/direitos_sexuais_reprodutivos_metodos_anticoncepcionais.pdf. acessado 25 06 2020
Outro guia muito bom e mais técnico: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/0102assistencia1.pdf
Alguns dados sobre a prevalência de métodos contraceptivos: “Contraceptive Prevalence, Any Methods (% of Women Ages 15-49) | Data.” n.d. Accessed June 26, 2020. https://data.worldbank.org/indicator/SP.DYN.CONU.ZS?end=2018&start=2018&view=bar.
“Products - Data Briefs - Number 327 - December 2018.” 2019. June 7, 2019. https://www.cdc.gov/nchs/products/databriefs/db327.htm.
Anel vagina. <http://www.apf.pt/metodos-contracetivos/anel-vaginal> acessado 26 06 2020.
Pílula do dia seguinte. <https://www.sns24.gov.pt/tema/saude-sexual-e-reprodutiva/pilula-do-dia-seguinte/#sec-0> acessado 26 06 2020.
Mulher engravida com DIU. <https://veja.abril.com.br/blog/virou-viral/mulher-engravida-usando-diu-e-posta-foto-inusitada-do-bebe/> acessado 26 06 2020.
Bebê nasce com DIU enrolado no cabelo. <https://catracalivre.com.br/saude-bem-estar/bebe-nasce-com-diu-enrolado-no-cabelo/> acessado 26 06 2020.
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