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Ivermectina é a solução?

Fala, minha gente, tudo tranquilo?


O tempo passa, mas a pandemia persiste. No Brasil os casos de Covid-19 aumentam a cada dia, mas seguimos esperançosos para o surgimento de um tratamento ou vacina que nos ajude a superar todo esse caos. Acontece que enquanto não temos uma cura, a esperança de muita gente acaba se tornando desespero, e somado a isso tem as notícias, boatos e afins que apresentam medicamentos como sendo “mágicos”, eficazes no combate a Covid-19, apesar de não apresentarem nenhuma comprovação científica.


Dentre o ‘coquetel’ de medicamentos, eis que aparece mais um para compor o time de “balas milagrosas” (leia nosso texto “O mito da bala mágica contra o Corona”), a Ivermectina. Vamos discutir um pouco sobre ela?


O que é a Ivermectina?


A Ivermectina é um medicamento antiparasitário, ou seja, é uma substância que, quando ingerida, age combatendo parasitas que estão infectando um ser vivo (pode ser humano ou outros animais). Estes parasitas podem ser vermes, piolhos e ácaros (agentes que podem causar sarna).


As doses recomendadas de uso da Ivermectina são bem baixas, sendo recomendadas entre 150 a 200 microgramas (mcg) por quilo de massa corporal.


Por que a Ivermectina apareceu como candidata ao combate a Covid-19?


Bom, isso se deve ao fato de que recentemente, no mês de maio de 2020, ter sido publicado um artigo científico intitulado “The FDA-approved drug ivermectin inhibits the replication of SARS-CoV-2 in vitro” (A droga Ivermectina aprovada pela FDA inibe a replicação do Sars-CoV-2 in vitro) que fala sobre o sucesso do uso da Ivermectina contra o vírus causador da Covid-19 (Sars-CoV-2), controlando a sua replicação dentro das células.



Mas só que tem um detalhe, esse trabalho foi realizado em células IN VITRO (como sugere o título), ou seja, em um tubo de ensaio, com ambiente determinado e totalmente controlado pelos cientistas.


Vale lembrar o que significa um estudo ter sido realizado in vitro. Este termo significa que houve testes de alguma substância, seja de origem natural ou sintética, que foi aplicada em células isoladas. Os cientistas literalmente cultivam algumas células em laboratório, utilizando placas de petri (uma placa de vidro) ou tubo de ensaio, mantendo-as vivas fora de um organismo mas dando a elas todas as condições necessárias para se manterem. Com isso eles podem administrar o uso de qualquer substância para ver o efeito, positivo ou negativo, que terá nas células isoladas.


Já os estudos in vivo são ensaios (testes) que podem ser realizados em organismos vivos utilizando diferentes tecidos celulares (diferentes tipos de células que compõem os órgãos). É um tipo de estudo que começa após os testes in vitro e possuem várias etapas, começando com pequenos animais como ratos. Os estudos in vivo são importantes para estabelecer níveis aceitáveis para consumo de substâncias (como remédios) e também para estabelecer os níveis de toxicidade delas.


Por que não podemos comemorar ainda ?


A partir do momento em que você sai de uma situação bem controlada, como um tubo de ensaio, e vai para outro ambiente, como um organismo vivo e complexo, a história pode ser completamente diferente. Primeiro, um ser vivo é influenciado por vários fatores, tanto internos quanto externos, que não são controlados. E segundo, cada organismo funciona de maneira única, de modo que um medicamento pode agir de forma diferente em cada um deles. Sendo assim, os resultados obtidos em células isoladas não podem ser generalizados para seres humanos.


Logo após a publicação desse artigo, a procura por Ivermectina aumentou muito. Inclusive alguns médicos a prescrevem como tratamento provisório para Covid-19 enquanto não surge nenhum outro medicamento comprovado cientificamente. O principal motivo é por que ela já é bastante conhecida (possui uma margem de segurança ampla) e sabe-se que os efeitos colaterais relacionados a dosagem recomendada são considerados “normais” (o famoso ‘pra quem não tem nada, metade é o dobro’).


A grande questão nisso tudo é que esse estudo que demonstrou a eficácia do medicamento foi bastante criticado com relação à sua metodologia. O estudo deveria ter sido feito com as doses apropriadas para seres humanos, porém, a dosagem de Ivermectina utilizada para impedir a replicação viral in vitro chegou a ser 17x maior que a dosagem mais alta encontrada na literatura (em estudos anteriores), além de ser 35x maior que a dose usual, o que significa uma overdose de Ivermectina! O remédio já possui alguns efeitos colaterais, mas não se sabe o que pode acontecer caso alguém consumisse quantidades enormes como a utilizada no estudo. Outro artigo aponta que essas super dosagens podem afetar a barreira hematoencefálica (um sistema de defesa natural que seleciona rigorosamente as substâncias que entram no nosso cérebro), podendo gerar graves danos ao sistema nervoso central.


E o mais importante de tudo, até o presente momento só foram realizados testes, ou seja, não há comprovação científica nenhuma de que a Ivermectina seja eficaz contra a Covid-19. Do mesmo modo, este mesmo medicamento mostrou-se eficaz, in vitro (em células criadas em laboratório), contra o vírus da dengue, gripe e outros tipos de vírus, mas nada que comprove seu uso em um organismo vivo.


Com base nisso tudo, vale levantarmos algumas reflexões: será que é ético espalharmos o uso desses medicamentos como sendo promissores na cura da Covid-19? Será que eu estou cuidando de mim mesmo ao aceitar ingerir algo que ouvi dizer ser eficaz? Lembrem-se, ninguém é contra o surgimento de um medicamento que ajude no combate ao novo coronavírus, ninguém torce para que o vírus continue se espalhando e que a pandemia continue... Somos sim a favor do aparecimento de algum tratamento, ou vacina, mas sempre de acordo com o que a ciência nos mostra e comprova. Nossa segurança vem em primeiro lugar.


Beleza, minha gente? É isso! Grande abraço e boa semana a todos!


Autor

Adriano Lima

Biólogo


Referências


CALY, L.; DRUCE, JULIAN D.; CATTON, MIKE G.; JANS, DAVID A.; WAGSTAFF, KYLIE M. The FDA-approved drug Ivermectin inhibits the replication of SARS-CoV-2 in vitro. Antiviral Research, 178. 2020. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0166354220302011. Acesso em: 16/07/20.


SCHMITH, VIRGINIA D.; ZHOU, JIE (JESSIE), LOHMER, LAUREN R.L. The approved dose of Ivermectin Alone is not the Ideal Dose for the Treatment of COVID-19. Clinical Pharmacology & Therapeutics. 2020. Disponível em: https://ascpt.onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/cpt.1889. Acesso em: 16/07/20


MOMEKOV, G. & MOMEKOVA, D. Ivermectin as a potential COVID-19 treatment from the pharmacokinetic point of view: antiviral levels are not likely attainable with known dosing regimens. Biotechnology & Biotechnological Equipment, 34 (1). 2020. Disponível em: https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/13102818.2020.1775118. Acesso em: 16/07/20.


Bula do Ivermectina. Disponível em: https://consultaremedios.com.br/ivermectina/bula. Acesso em: 16/07/20.


Os ensaios in vitro e in vivo: O risco que devemos tomar. Disponível em: https://www.farmacapsulas.com/pb/in-vitro-in-vivo-riesgo-necesario/. Acesso em: 19/07/20.



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